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Úrsula Maior, Úrsula Menor
As moções de outubro não vão fazer cair a Comissão - disso não há dúvidas. Mas vão servir para mais uma encenação daquilo que já é o verdadeiro dilema europeu: instituições estáveis, mas eleitorados instáveis. Um fosso que não se fecha com contas certas.
Publicado em 10/09/2025 14:58
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Em outubro, a Comissão Europeia volta a ser posta à prova com duas moções de censura. Não uma, mas duas - como quem repete a dose para ver se, à segunda, a receita pega. De um lado, a esquerda radical; do outro, a extrema-direita. Um casamento improvável, mas que encontra terreno comum no alvo: Úrsula von der Leyen.

Só que, números são números. E no Parlamento Europeu, as contas não enganam: o bloco PPE, Socialistas & Democratas, Liberais e Verdes soma perto de 450 deputados - mais do que suficiente para blindar a Comissão contra qualquer aventura de queda. Do outro lado, Patriotas pela Europa, Conservadores (ECR), parte da Esquerda e uns independentes ruidosos podem reunir cerca de 200, talvez 220 votos. Mesmo num cenário “todos contra Úrsula”, as contas não chegam aos 361 necessários para virar o jogo. Resultado previsível: moção chumbada, Ursula intacta.

Mas há aqui uma nuance. Úrsula sobrevive “maior” nos números, mas “menor” no ambiente político que a rodeia. Porque enquanto em Bruxelas reina a aritmética tranquila das maiorias centristas, nos Estados-membros a história é outra:

- Em França, Macron governa em minoria e a extrema-direita olha para 2027 com apetite.
- Na Alemanha, a coligação “semáforo” cambaleia, com a AfD a crescer nas sondagens.
- Em Itália, Meloni segue firme com o seu peso no ECR.
- Nos Países Baixos, Wilders é já parte do poder.
- Em Espanha e Portugal, governos minoritários navegam em águas agitadas.

Ou seja: no plenário europeu, Úrsula é “maior”, com números sólidos que lhe garantem sopro para continuar. Mas no terreno político nacional, Úrsula é “menor”, porque a cada eleição nacional cresce o coro dos que contestam a legitimidade de uma Comissão que, embora formalmente europeia, parece cada vez mais distante das urgências populares.

As moções de outubro não vão fazer cair a Comissão - disso não há dúvidas. Mas vão servir para mais uma encenação daquilo que já é o verdadeiro dilema europeu: instituições estáveis, mas eleitorados instáveis. Um fosso que não se fecha com contas certas.

E assim, quando o plenário rejeitar as moções e Úrsula sorrir mais uma vez para as câmaras, poderemos pensar: Úrsula maior, pela força dos votos que a seguram. Úrsula menor, porque, no fundo, cada sobrevivência é também uma lembrança de que a sua vitória em Bruxelas não reflete necessariamente a tempestade que cresce nas capitais da União.

 



Autor: João Gomes
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